quarta-feira, 3 de julho de 2013

NOVEMBRO NA ALMA - capítulo 4





Perdão para mais um nome aqui, o de Arthur Schopenhauer, autor de “Sobre o Ofício do Escritor”, volume da Martins Fontes em que se reúnem três textos contidos originalmente em “Parerga e paralipomena”, de 1851. O livro é um deleite de espadachim. Nele, o filósofo está muito bravo com os jornalistas de sua época (não terá sido o último depois de Balzac), com a cordialidade que exibiam em relação aos amigos na hora de fazer críticas, comprometidas e analfabetas. Schopenhauer não se conformava com a Alemanha de então, que concedia anonimato aos resenhistas de livros para que eles pudessem, entre outras coisas, desancar um talento novo como o do próprio filósofo. Ele acreditava que quem se favorecia dessa situação eram os medíocres, autorizados a modificar a língua contínua e erroneamente em papel-jornal, desrespeitando todas as leis de sintaxe e lógica, respaldados por um ideal duvidoso de concisão.

“Os chamados doutos emulam com os literatos de jornais e revistas: é uma competição entre a estupidez e a falta de ouvidos”, afirma ele a certa altura do livro, para sentenciar: “A língua alemã foi completamente posta em desordem: todos deitam-lhe a mão, qualquer velhaco rabiscador lança-se sobre ela.”

O livro está cheio dessa compreensão feminina da língua-mãe. Ela é a moça vilipendiada por mãos cabeludas, a vestal denegrida... Para Schopenhauer, o novo não faz bem à mulher-linguagem: raramente o que é novo é bom, e o escritor deve saber ausentar-se das preferências públicas. Há uma compreensão sua de que o grande povo repudia o refinamento da escrita por preferir as novidades _ mais de conteúdo, que ele chama “matéria”, do que de escrita, ou “idéia”. Ao público alemão daquele tempo já bastavam as fofocas dos jornais... Mas, para Schopenhauer, algo mais deveria guiar um leitor. Algo relacionado às iluminações, estas que existiriam naturalmente na escrita de um grande artista. Um verdadeiro escritor trata a língua como o instrumento da descoberta do que um homem é.


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